Flamenguinho: a história de um time de futebol que formou campeões dentro e fora de campo

O futebol é um esporte coletivo que tem o poder de ultrapassar barreiras, transformar realidades e despertar, principalmente nos jovens, o espírito de equipe, o respeito, a confiança, a disciplina, a solidariedade, a responsabilidade, a dedicação, o compromisso e a ética.
Mais do que uma simples modalidade esportiva, o futebol também é capaz de unir pessoas, consolidar amizades e compartilhar emoções que fortalecem o sentimento de pertencimento, cultivam o sonho de um futuro melhor e contribuem de forma decisiva para o crescimento pessoal, familiar, social e profissional de crianças e adolescentes do mundo inteiro.
Em Cariacica não foi diferente. A história do Flamenguinho, time de futebol amador fundado em 1967, no Bairro Porto de Santana, por dois funcionários da Vale – os beneméritos Fernandes de Araújo Lima e Moacir Radanelli – é uma prova inquestionável da influência positiva que o futebol pode exercer na formação do caráter de jovens atletas e em sua aprendizagem sobre valores morais e cristãos essenciais para um bom direcionamento na vida.

O EXEMPLO DO FLAMENGUINHO

Para jogar no Flamenguinho – time que entrou para a história do futebol cariaciquense e capixaba como um dos mais organizados, competitivos e respeitados, devido à sua trajetória de grandes vitórias e conquistas –, os atletas eram obrigados a cumprir uma rotina rigorosa, sem relaxar com os estudos.
Todos os jogadores da agremiação tinham que respeitar os horários, manter a disciplina, se dedicar com afinco às atividades e treinamentos e, principalmente: não podiam beber, fumar, perder noites de sono, brincar na rua, frequentar bares e nem se envolver com drogas e outras “coisas erradas”. Andar na linha era uma condição inegociável para os atletas continuarem no grupo. E eles ainda precisavam participar assiduamente de todas as atividades do time, de forma organizada, responsável e comprometida.


SEM PISAR NA BOLA


O Flamenguinho trabalhava com método, planejamento e um controle rigoroso dos hábitos dos jogadores, que também tinham que cumprir suas obrigações diárias, pois eram acompanhados de perto pelos líderes da equipe. Quem “pisava na bola” recebia advertência e até suspensão. Como ninguém queria ficar fora dos jogos aos domingos,todos se comportavam de maneira exemplar,conforme era exigido. E isso se transformou em regra, não em exceção.

A EMOÇÃO DO REENCONTRO


A saudade dos velhos tempos e a gratidão pelas excelentes oportunidades que tiveram depois de jogar no Flamenguinho levaram alguns de seus atletas a retomarem o contato com os demais amigos e companheiros de time, para se reunirem pela primeira vez após longos anos de distanciamento.
Este emocionante reencontro aconteceu neste domingo (01/12), no Clube dos Empregados da Cesan, no Bairro Cobilândia, onde muitos jogadores do Flamenguinho estiverem presentes em uma animada confraternização e puderam lembrar, com grande saudosismo e alegria, dos momentos mais marcantes que viveram juntos na época de infância e juventude, jogando no time.

Confira, abaixo, algumas histórias memoráveis contadas pelos próprios jogadores, sobre o Flamenguinho e suas principais experiências como membros deste grupo que deixou marcas profundas em sua formação moral e preparação para vencer, também, o “jogo
da vida”:


HISTÓRIAS INESQUECÍVEIS

Arnaldo Araújo Lima, 69 anos, metalúrgico aposentado – Fui um dos fundadores do Flamenguinho. Meu pai, “Seu Fernandes”, trabalhava na Vale, chegava em casa às 16hs e sempre se deparava com muitas crianças brincando na rua. Ele se incomodava muito com isso e começou a organizar a garotada para ocupar o tempo livre fazendo exercícios, com o objetivo de melhorar a preparação física. Pouco depois, meu pai planejou a criação de um time de futebol e mesmo sendo vascaíno, ele fez uma votação entre a criançada, para definir o nome do time que estava prestes a fundar. E por livre escolha da maioria, o nome escolhido foi “Flamenguinho”. E assim surgiu a história da nossa equipe.
Após algum tempo cuidando da preparação física da turma, o time conseguiu uma área conhecida como “Péla-Pasto”, em Porto Novo, para treinar futebol. O local não tinha nada. Precisamos limpar o terreno e abrir espaço na enxada. Todos ajudaram. Fizemos um verdadeiro mutirão e deixamos tudo pronto para treinar e jogar.

Mas para isso, a gente tinha que andar por mais de três quilômetros carregando as traves nas costas. E a gente fazia esse esforço com muito ânimo e alegria, porque os treinos do time eram o nosso compromisso mais importante naquela época. E a gente aguardava os treinos com muita ansiedade.
Até que no dia 02 de junho de 1967, o Flamenguinho foi fundado oficialmente e se tornou o time de futebol mais importante de Porto de Santana. Começamos jogando “peladas” descalços mesmo, por um bom tempo. Depois, com a chegada de novos membros – como Tião Soldado, Mateus e Valdir Baretta, entre outros – a equipe decidiu passar a usar chuteiras e isso aumentou muito o respeito pelo nosso time, que se destacou pelo talento, disciplina e foco dos jogadores, e ainda pela organização do grupo, seriedade do trabalho e método de treinamento: fatores que nos levaram a vencer a maioria das competições.
O time era muito bem cuidado. Meus pais ajudavam a gente de todas as formas que podiam. Todos os jogadores eram tratados como parte de uma grande família. Recebiam lanches, orientações, acompanhamento escolar e social, além de especial atenção, acolhimento, carinho e também puxões de orelha quando isso era necessário.


João Batista Neto (Jota Neto), empresário, 70 anos- Comecei a jogar no Flamenguinho em 1968. Na ocasião, o presidente fundador do clube (“Seu Fernandes) era linha dura e fazia semanalmente uma reunião em sua casa, para discutir assuntos referentes ao clube e à disciplina dos atletas. Isso acontecia sempre após os exercícios físicos quer fazíamos, subindo e descendo ladeiras do Morro do Meio, que hoje chama-se Bairro Presidente Médice.
Me lembro bem de dois fatos inusitados que aconteceram naquela época: o primeiro foi uma viagem a Cachoeiro do Itapemirim, que fizemos na carroceria de um caminhão, sentados em bancos de madeira. Foram quase quatro horas de viagem, uma verdadeira aventura. Chegamos lá bastante cansados, mas fizemos bonito jogando contra o time juvenil do Estrela.

Um outro fato inusitado aconteceu com as traves do campo onde jogávamos. Uma senhora que morava perto do campo tinha um fogão à lenha e passou a retirar as traves para usar como lenha. Daí, surgiu a ideia de criarmos uma trave móvel. E todo domingo, antes da gente ir para o campo, passávamos na Rua da Vitória (na casa do saudoso senhor Augusto, que criava ovelhas e cabras),para pegar os esteios e os travessões das traves que carregávamos nas costas, para instalar no campo. No final de cada jogo, tínhamos que fazer todo o processo inverso para guardar as traves em segurança e evitar que elas virassem lenha no fogão da vizinha do campo “Pela Pasto”, no Bairro Porto Novo, onde a gente jogava.
E por fim, não posso deixar de citar as lembranças que ainda tenho da “Dona Ivone”, esposa do “Seu Fernandes”, que era uma grande colaboradora do nosso clube e que organizava, em frente à sua casa, as saudosas “cantigas de roda” que tanto nos alegrava.
Que bom que pude viver tudo isso ao lado dos meus amigos jogadores, na época mais feliz de nossas vidas.


Sebastião Lopes, 67 anos, metalúrgico aposentado – Comecei minha história no Flamenguinho como torcedor, assistindo quase todos os jogos do time. Eu sempre acompanhava as partidas e por ocasião de um jogo quer aconteceu no Bairro Bubu, faltou um jogador e o treinador Jarbas Gonçalves, que também foi um dos fundadores da equipe, me escalou para “tapar o buraco”. E foi aí que eu entrei para o grupo. Me lembro que naquele dia, recebi uma camisa de tamanho maior, que ia até os joelhos, mas deu tudo certo e minha estreia foi um sucesso.
Por isso, segui participando das atividades do Flamenguinho na Escolinha, na equipe Aspirante e no time Titular, sempre com a mesma disposição, num período em que o clube tinha mais de 40 jogadores em seus quadros. E a gente vencia a grande maioria dos jogos que disputávamos. A Escolinha jogava nos sábados e o time Titular, nos domingos.

O tempo foi passando, mais e mais atletas foram chegando e o grupo inteiro participava das reuniões que aconteciam aos sábados. Quem não comparecia, não jogava aos domingos. Tudo era muito organizado. “Seu Fernandes” era como um pai para a gente e nosso grupo, na verdade, formava uma grande família. Uma família unida, disciplinada, educada, respeitosa e bastante motivada.
E este reencontro de hoje, que está reunindo a maioria dos jogadores do Flamenguinho, está sendo uma ótima oportunidade para gente lembrar da nossa história e de tudo o que vivemos juntos naquela época. Essa iniciativa foi Arnaldo, filho do “Seu Fernandes”.
Ele foi na minha casa e conversou comigo sobre a importância de localizar os outros membros da nossa equipe, exatamente com o objetivo de marcar este encontro. E deu certo! Realizamos várias pequenas reuniões entre os líderes do grupo e, assim, conseguimos resgatar o contato dos jogadores e quase todos vieram! Alguns, infelizmente, já faleceram, mas tem gente aqui que eu não via há 50 anos. Por isso, a emoção é grande!


João Bosco Radaelli, pintor autônomo, 62 anos – Sou filho de Moacir Radaelli, um dos fundadores do Flamenguinho. Meu pai e “Seu Fernandes” criaram o time quando eu tinha apenas cinco anos de idade. Comecei a acompanhar a equipe e cheguei à posição de goleiro do time Titular com 14 anos. A pressão do meu pai para que eu tivesse sempre um bom desempenho era grande e, treinando com afinco, também pude atuar no time como centroavante. Às vezes eu jogava como goleiro do Aspirante e como centroavante do time Titular. E às vezes, eu jogava como centroavante do Aspirante goleiro do Titular. Era uma alegria participar, não importava a minha posição.
Tive a honra de atuar ao lado dos melhores jogadores de futebol amador daquela época, como Dilson Pontão, Jorjão, Zé Carlos, Jarbas e tantos outros craques. Por esta razão, eu também tinha que ter uma performance de craque! Essa foi a motivação que me levou a ser, durante alguns anos, um dos artilheiros da equipe.

Um dos acontecimentos mais marcantes da nossa história foi quando o Flamenguinho disputou pela primeira vez o “Jogo da Paz”, enfrentando o time do América, nosso maior rival e adversário. Na semana em que disputamos essa partida, o confronto entre as duas equipes foi o assunto mais comentado em Porto de Santana e nos bairros vizinhos. Todo mundo achava que o América venceria fácil porque seus atletas tinham mais experiência jogando com chuteiras. Mas vencemos o jogo por 6 X 1 e essa vitória de goleada, que surpreendeu a todos, entrou para a nossa história como um episódio inesquecível.
E hoje, neste primeiro grande reencontro da nossa turma, aqui no Clube dos Empregados da Cesan, a história da goleada que deixou o América na berlinda está sendo relembrada com muito orgulho por todos os presentes. Infelizmente, alguns dos nossos companheiros já faleceram, mas nossas lembranças continuam guardadas no coração, com especial carinho.


Antônio de Oliveira (Fio Maravilha), metalúrgico aposentado, 68 anos – Ganhei o apelido de Fio Maravilha em homenagem ao folclórico craque que chegou a jogar na Desportiva Ferroviária, mas que se consagrou no Flamengo, onde marcou muitos gols em partidas importantes, tornando-se muito popular perante a torcida rubro negra.
Entrei na Escolinha do Flamenguinho jogando descalço e participando de peladas. Pouco depois, passei para a equipe Aspirante e mais tarde conquistei minha vaga no time Titular, atuando como centroavante, posição em que vivi uma fase muito boa jogando de chuteiras.
Participei dos melhores momentos do Flamenguinho, disputei muitas partidas, fiz muitos gols e ajudei o time a vencer a maioria dos jogos. Por isso, estou muito feliz em reencontrar meus antigos companheiros de time e poder lembrar, ao lado deles, das nossas histórias, nossas aventuras e das nossas maiores conquistas como equipe.

Fernandes”, que foi nosso pai e professor, e do saudoso Jarbas, que foi um exímio treinador e um parceiro de todas as horas.
O aprendizado que tivemos no Flamenguinho, durante a infância e a adolescência, foi fundamental para nortear nossos caminhos na fase adulta das nossas vidas. Todos os que participaram do nosso grupo se tornaram cidadãos plenos, produtivos, honrados, atuantes, éticos e respeitados pela sociedade. Até hoje trazemos na bagagem os principais valores que aprendemos no time, como seriedade, respeito, disciplina, espírito de equipe, dedicação, compromisso e foco em nossas metas. Isso fez toda a diferença em nossa formação e crescimento pessoal, familiar, social e profissional. Sinto muito orgulho e gratidão por ter feito parte dessa história.


Mateus João dos Santos, 71 anos, funcionário aposentado da Cesan – Cheguei no Flamenguinho em 1972, com 19 anos, no período em que eu estava servindo ao Exército.
Naquela época, eu tinha dois primos que jogavam no time e me convidaram a ingressar no grupo. Como sempre morei em Vila Velha, não era fácil ir treinar futebol em Cariacica.
Mas graças a Deus eu consegui conciliar minha rotina e participar efetivamente da equipe, onde permaneci de 1972 a 1990. Ao longo de todos esses anos, joguei como cabeça de área e lateral direito, e tive a honra de ser presidente do Flamenguinho por dois mandatos.
No começo dessa história, de 1968 a 1974, nossa equipe jogava descalço e mesmo assim o nível técnico dos jogadores, nas peladas, era excelente. Em 1975, três anos após a minha entrada no Flamenguinho, começamos a jogar com chuteiras. Esta transição foi muito importante para a evolução e o aperfeiçoamento do time, que conquistou grande reconhecimento e sucesso sob o comando do técnico “Tião Soldado”, que era Sargentoda Polícia Militar, e do auxiliar técnico e diretor de futebol “Valdir Baretta”, que era agente da Polícia Civil. Trabalhando com esses policiais, os atletas do Flamenguinho reforçaram sua disciplina e treinaram com maior rigor e foco, o que resultou em muitas vitórias importantes para a equipe.

Geralmente, o Flamenguinho jogava quatro vezes por mês, aos domingos. Mas às vezes, a gente ficava fora das partidas durante um domingo, porque alguns membros do time nunca tinham jogado de chuteiras e essa adaptação requereu uma preparação extra, com exercícios físicos e treinos com bola. Por esta razão, intensificamos os treinamentos dos jogadores e a partir de então – de 1975 até os primeiros anos da década de 2000, quando encerramos nossas atividades – todos os nossos atletas jogaram de chuteiras.
Essa e muitas outras lembranças continuam vivas em nossas memórias e hoje, neste primeiro grande reencontro da nossa turma, estamos matando a saudade e lembrando dos momentos mais importantes da nossa história. É com uma alegria imensa que estou aqui revivendo essa fase incrível da minha vida junto aos meus irmãos de equipe. Na verdade, formávamos uma grande família e até hoje ainda mantemos os mesmos laços que nos uniu em nossa juventude. Estou revendo amigos que não via há 50 anos. E quero que esta emoção se repita muitas vezes a partir de agora.

Dilson Menezes (Dilson Pontão), 69 anos, autônomo aposentado – Com 11 anos de idade eu saí de Itacibá e fui morar em Porto de Santana. No ano seguinte, comecei a treinar na Escolinha do Flamenguinho e aos 15 anos, eu já jogava no time Titular como ponta esquerda. Fui jogador do Flamenguinho durante 23 anos e nesse período, somando as peladas que joguei descalço e os jogos que disputei usando chuteiras, marquei um total de 1.260 gols.
Este feito me faz sentir orgulho, pois simboliza uma carreira vitoriosa e um legado histórico que estou deixando para as futuras gerações, como jogador de futebol do Flamenguinho, ao lado dos meus valorosos companheiros de time.

Eu me lembro de vários momentos importantes que marcaram a história do nosso time, ao longo dos anos. Um deles foi a partida contra o Cruzeiro, em que o Flamenguinho estava perdendo de 3 X 0 e ninguém mais acreditava em nossa vitória. Assim que o treinador me colocou em campo, as coisas mudaram. Com a ajuda dos da equipe,marquei quatro gols, vencemos o jogo por 4 X 3 e consolidamos uma virada inesquecível.
Durante o período em que eu joguei no Flamenguinho, tive a chance de tentar a carreira profissional como jogador de futebol. Treinei no Rio Branco, fui aprovado no teste, mas acabei desanimando. Depois, devido à demora em conseguir participar de testes em outros times, desisti de vez dessa ideia, apesar da minha grande habilidade com a bola e do meu nível técnico, que realmente era acima da média.


Domingos Antônio Martins (Sete Cachos), 72 anos, motorista, primeiro presidente do Flamenguinho – Na casa de uma tia minha que morava no Bairro Ataíde, em Vila Velha, tinha uma bananeira que produzia sete cachos de banana. Então, peguei uma muda dessa bananeira, plantei em Porto de Santana e fiz a maior propaganda disso. No entanto, a muda que plantei só conseguia produzir cinco cachos e por este motivo, ganhei o apelido de “Sete Cachos”.
Independente desta curiosidade, minha história no Flamenguinho começou assim que o time foi fundado, em 1967. Venho de uma família humilde e a chance de ser convidado a participar do time foi uma alegria, pois eu passei a usar meu tempo livre fazendo atividades produtivas, saudáveis e que me influenciaram positivamente para que eu não me desviasse do caminho do bem.
Durante minha infância e adolescência, participei da Escolinha, da equipe de Aspirantes e do time Titular do Flamenguinho, jogando na posição de quarto zagueiro. Sempre me dediquei aos treinamentos e às partidas. Ajudei a vencer muitos jogos e sempre fiz questão de manter a tradição do nosso time no futebol. E hoje estou aqui reencontrando amigos que fazem parte dessa história.

Vale ressaltar, assim como outros já fizeram, que “Seu Fernandes” criou uma família e não apenas um time de futebol. Ele foi um pai para mim, pois o meu pai verdadeiro foi embora de casa quando eu ainda era muito pequeno e minha mãe trabalhava fora. Por isso, a atenção, o carinho e o acolhimento que eu sempre recebi do “Seu Fernandes”, dos líderes da equipe e dos meus amigos de campo, fizeram toda a diferença na minha vida, quando eu mais precisei de amparo e cuidados.
Me lembro que após nossas reuniões com “Seu Fernandes”, ele determinava que a gente fosse direto para casa. Depois de meia hora, ele percorria os morros de Porto de Santana para ver se encontrava algum jogador do time em porta de boteco ou brincando na rua.
Se ele encontrasse alguém da equipe pela frente, esse atleta era suspenso e ficava fora do jogo seguinte. Por isso, todos o obedeciam. Essa disciplina contribuiu muito para o desenvolvimento dos jogadores. Tanto que quando me tornei o primeiro presidente do Flamenguinho, encontrei atletas muito bem alinhados com nossa forma de atuação. Já peguei um trabalho organizado e bem encaminhado e essa experiência foi marcada por inúmeros momentos felizes e inesquecíveis.
Todos os domingos a gente se divertia muito. Depois dos jogos e das nossas atividades no time, nós íamos para a casa do Dilson Pontão para ouvir o programa “Tarde Dançante”, da Rádio Difusora de Cariacica, e isso virava sempre uma grande festa.


Sebastião Alves da Silva (Tião Soldado), 74 anos, Policial Militar aposentado – Fui convidado para entrar no Flamenguinho na época em que o time ainda jogava descalço mas já era imbatível em campo. Tudo aconteceu numa noite, depois que cheguei do trabalho e recebi a visita de Mateus, Jarbas e Arnaldo, que eram coordenadores da equipe e me chamaram para cuidar da preparação dos atletas do time, para que eles passassem a jogar de chuteiras.

Eu era meia esquerda da equipe da Cesan, mas tive que parar de jogar e pausar minha participação em campo devido a um problema cardíaco. Por este motivo, aceitei o convite e fiz um projeto de preparação técnica para que os atletas do Flamenguinho começassem a treinar e a jogar de chuteiras. Então, quando cheguei ao grupo, já comecei atuando como técnico e levei Valdir Baretta para trabalhar ao meu lado, como auxiliar técnico.
Fizemos um cronograma de três meses de treinos envolvendo chutes a gol, cobranças de
faltas e escanteios, jogadas ofensivas e defensivas, táticas de jogo e outras atividades. O projeto deu certo e em 1975 os jogadores do time passaram a jogar de chuteiras. Essa fase de transição foi determinante não só para o aprimoramento dos atletas, mas também para o próprio crescimento do Flamenguinho.
E hoje, ao rever os amigos que fizeram parte desta história, meu coração se enche de alegria e emoção, pois juntos vivemos e compartilhamos inúmeras lembranças e momentos que marcaram nossas vidas para sempre. Aproveito e peço desculpas a todos pelo rigor da disciplina militar que usávamos como ferramenta de trabalho, pela durezados nossos treinamentos com o uso de chuteiras, pela dedicação e seriedade que exigíamos de cada um dos atletas e pelas festas e bailes que eles deixaram de participar, para manterem suas vagas no Flamenguinho.
Mas acho que tudo isso acabou contribuindo também para que todos tivessem uma formação digna e se tornassem pessoas melhores, em retribuição à memória e ao legado daqueles que já se foram.

José Carlos dos Santos,69 anos, eletrotécnico aposentado – Cheguei ao Flamenguinho a convite do amigo Tião Soldado, em 1975, e joguei como meia direita e volante da equipe Titular. Esta oportunidade foi a salvação da minha geração, que encontrou no esporte uma direção segura, decente, digna, saudável e promissora para seguir, numa época em que muitos jovens da periferia se enveredavam por caminhos tortuosos e já se deixavam levar pela sedução das drogas e do dinheiro fácil oriundo da criminalidade. Sou muito grato por isso.

Participei das principais conquistas do Flamenguinho e fiz parte das melhores histórias vividas pelo time, ao longo dos anos, até 1981, quando precisei sair da equipe para trabalhar. Pude conhecer e conviver com os melhores jogadores de futebol daquela época e acompanhei de perto a jornada de muitos deles. E os amigos que estiveram ao meu lado durante essa trajetória vitoriosa do nosso time ainda hoje contam com a mesma confiança, respeito e admiração de sempre.
Construímos uma grande família sob a liderança do “Seu Fernandes” e o companheirismo de Jarbas Gonçalves. Eles nos ensinaram sobre os conceitos e valores mais importantes da vida, e nos ajudaram a crescer não somente como atletas, mas principalmente como pessoas de bem e membros exemplares da nossa sociedade. Este legado é um patrimônio de valor imaterial que remonta a história do futebol amador em Cariacica e no Estado do Espírito Santo.

Por Cláudio Figueiredo 

Fotos: Jota Neto 

Momentos de Confraternização 

Fotos: Jeanne 

 

Agradecimentos:

– A direção do Clube dos Funcionários da Cesan;

– Ao Jornalista Cláudio Figueiredo pela cobertura jornalística do Evento;

Aos líderes e organizadores do Evento ;

– A todos os ex-atletas e familiares que apoiaram e participaram do Evento;

 

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